segunda-feira, 10 de novembro de 2014

Só mais um




Às vezes dá vontade de chorar... Nem é mais pela tristeza, frustração, decepção ou sei lá o que... Ás vezes dá vontade de chorar só porque você sente o peito cheio de água que não escorreu. Senta a alma cheia de dor que você não quis sentir. E aí entre um e mail e outro, entre uma busca e um tanque de roupa suja, você para e percebe o olhar solto no ar, o nó que aperta, a pensamento que voa e o sal pinicando os olhos. Está tudo tão cheio dentro de você daquilo que não quis deixar vir, que tem hora, de hora em hora, ele vem com tudo, como uma onda na arrebentação, mergulhante ou tubular, deslizante e ascendente, querendo quebrar em algum lugar... Que saudade de dor de amor, agora, me parece que ela era mais fácil de sentir. E aí você respira, aperta os dedos contra as mãos, bebe uma água gelada e volta pra outro momento de abstração. Afinal é só mais um passo, mais um degrau, mais uma casca de banana no meio do caminho. Apenas isso.

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

Num ponto...

 Em pé no ponto de ônibus espero pacientemente. Sentada, atrás de mim, ela conversa com uma outra transeunte qualquer que parou e também espera por seu ônibus. Ela puxa papo com a jovem desconhecida e fala que espera o ônibus que vai para o Paraíso, mas que até agora só passa o Ana Rosa. Ela puxa papo, ri, e a outra moça responde animada com a inesperada conversa.
 Em São Paulo não são muitos que se dão para conversas sem objetivos ou com estranhos.
 Um ônibus passa e sua mais nova colega vai com ele. O meu ainda demora "acho que pegar ônibus nesse horário é um mau negócio" - penso. Quando ouço novamente sua voz, solta pelo ponto, rodeada por desconhecidos que olham para frente mecanicamente e ignoram suas falas enquanto esperam seu ônibus. Resolvo olhar para trás pois percebo que ela fala ao léu, sem nenhuma resposta; talvez meu olhar amigo lhe diga que é ouvida e se sinta bem, quem sabe menos sozinha? Enquanto olho para ela em um coluio não combinado, penso nas pessoas que puxam papo em pontos de ônibus, quem são, como são, que tipo de pessoa é esse. Imediatamente ela capta meu olhar e continua a falar, agora para mim. Primeiro comenta da amiga anterior, diz que ainda tem cara de boneca com seus 23 anos! Elogia o jeito fofo e estiloso da outra se vestir. Eu, dou um sorriso. Então ela fala do péssimo trânsito nesse horário, quase como se tivesse lido meu pensamentos de uns segundos atrás. Repete que espera o ônibus que vai pro Paraíso, mas que até agora, só passa o Ana Rosa. Eu concordo e dou outro sorriso.
(Ponto de ônibus na Avenida Paulista, pelo olhar de Paulo Stocker) 
 Ela é magra, aparente ter seus vinte poucos ou talvez seus trinta e poucos. Cabelos encaracolados e escuros, com um lenço que enfeito o topo de sua cabeça. Segura uma mochila no colo, tem olhos estreitos e sorriso largo.
 Olho para frente enquanto ela fala "Parece que passa o ônibus de todo mundo, menos o meu!" Eu começo a achar que o meu também não vem, até que avisto ele de longe, descendo a rua. Faço sinal, dou um sorriso e me despeço, afinal, talvez ela tenha me dado sorte! "Vai com Deus", ela diz, e eu vou.
 Já sentada continuo a pensar nos tipos de  pessoas que puxam papo com estranhos nos pontos de ônibus. Percebo então que sem livro pra ler ou vontade de mexer no celular, resolvo olhar para vida. Uma senhora ao meu lado que olha pela janela sem se virar um segundo, suspira, suspira. Um rapaz do outro lado lê seu jornal, sessão de esportes. Uma jovem que passa o bilhete e gira a catraca enquanto seu filho espera sentadinho no banco... Engraçado, aquela moça do ponto me fez ter vontade de olhar para vida. Uma moça que estava apenas sentada esperando seu ônibus para ir para o Paraíso, mas logo hoje só passa o Ana Rosa.